A astrologia é uma forma de ler o mundo.
Mas toda linguagem é carregada de valores sociais, construídos simbolicamente pela cultura que a manuseou e redefiniu seus fundamentos. A astrologia não surgiu “do nada”, ela possui uma história, porém tremendamente fragmentada. E nessa trama de romantizações e amnésias é tarefa árdua reconstruir sua memória: o que veio antes da historiografia oficial. Já falei por aqui que essa tecnologia foi utilizada pela colonialidade, vide seu discurso eugenista e racista em Vettius Valens e quando foi utilizada para justificar que povos originários do sul global nasceram sob um céu que os condenava à mentira, lascívia e subalternidade. A convicção de que a visão de mundo ocidental é o centro de tudo, e as demais compreendidas a partir desse modelo, é uma doença branca, o Yurugu pensado por Marimba Ani. Eis o porquê de trabalhar o território da memória na astrologia. Mas como diz Cida Bento, memória não é apenas recordação ou interpretação, mas também revisão da narrativa sobre um passado “vitorioso” de um povo, revelando e fazendo críticas aquilo que as sociedades escolhem esquecer, apagar ou inventar. Venho buscando desvinculá-la do padrão epistêmico ocidental como única referência. E como forma de desobrigar o eurocentrismo, comecei a dialogar com outros saberes, mitologias, e pensar outras formas de ler o mundo a partir de quem veio antes do ocidente se configurar ocidente para construir contranarrativas. Isso não é torná-la uma Astrologia dos Orixás, que são divindades primordiais Iorubás, comunicam-se nos búzios, dentro da ritualística e tradição do candomblé, por exemplo. Seus itan são narrados na tradição oral de Ifá, codificados iniciáticamente nesse corpo-filosófico-religioso e nele se apresentam em magiação conduzida por ikins e opelé. É sobre o que as cosmosensibilidades de Ifá podem ensinar para a Astrologia e ajudá-la a fazer crítica ao eurocentrismo, e menos sobre o que a Astrologia em seu atual estado de sucateamento pode solitariamente produzir enquanto ferramenta de orientação. Defendo ouvir e aprender com quem veio antes para contribuir na emergência (urgente) de outras perspectivas em sua prática.
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AutorFelipe Zúñiga: Histórico
November 2022
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