Xangô gostava muito de viajar para terras vizinhas para conhecer os costumes e ritos dos povos e como viviam. Em uma de suas peregrinações ele chegou a uma terra que se chamava Ara-Male. E Xangô foi logo rendendo moforibale aos habitantes como se fazia em seu reino, mas observou que eles faziam de outra forma. Os Ara-Male tinham uma grande devoção a Olorun, sob a forma do Sol. E logo no raiar do dia todos se levantavam e guardavam jejum até o meio-dia realizando uma cerimônia que consistia em pedir bençãos a Olorun.
Todos se reuniam ao redor de uma cabaça contendo Saraekó, uma espécie de mingau que para eles representava o desjejum e o almoço. Tempos depois, Xangô retornou a terra de Ara-Male e viu a grande harmonia e tranquilidade que tinha seu povo. Isso lhe fez pensar nos problemas que há muito afligiam Takuá, uma terra que vivia em guerra com todas as vizinhas, e que por consequência dos conflitos cada vez mais intensos seu povo não tinha paz e não realizava mais cerimônias para seus Orixá, Ancestrais e Olorun. Inspirado pelos ritos dos Ara Male, ele recolheu a cabaça do Saraekó e levou consigo até Takuá. Lá chegando, reuniu todo o povo e explicou a eles a necessidade de realizar a cerimônia do Ñangareo, e que todos deveriam reverenciar não apenas Olorun, mas também aos seus antepassados. Os mais velhos foram então buscar terra e areia para apoiar a cabaça e um a um, dos mais velhos aos mais jovens, todos iam rogar a Olorun e aos presentes. A partir desse momento, a tranquilidade, a paz foi retornada a Takuá e em todas as terras Yorubás. Lara Sayão fala no prefácio de Filosofias Africanas de Nei Lopes e Luis Simas que o pensamento ocidental perdeu a noção do que é comunidade nessa corrida louca por títulos que denominamos conhecimento. Vou além: o paradigma ocidental nunca teve em seu projeto colonialista/capitalista/patriarcal qualquer compromisso com o comunitário. Fracassamos enquanto sociedade, mas podemos caminhar para um outro lugar de sociabilidade. Precisamos de Saraekó, de Xangô, do pensamento e cosmosensibilidades do sul global, que nos mostram como resolveram há milhares de anos crises sistêmicas com encruzilhada, palavra encantada e xirê.
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AutorFelipe Zúñiga: Histórico
November 2022
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